domingo, 28 de setembro de 2008

Uma Carta à Desilusão.

Não se preocupe comigo. Digo, pois é sincero: Não se preocupe comigo. Há aqueles que nascem inteiros de si, só precisam se reencontrar. Como a mãe que procura no retrato o filho que já morreu. Como o homem procura o consolo da vida na lembrança de um bom sorriso. Como a gente procura o nosso amor na imensidão vaga de uma saudade. Não se importe de mim. Minhas armadilhas já estão prontas: um dia hei de pisar nelas. Não se importe com minhas feridas. O sangue que suja o corpo é o mesmo que lava o chão. Afinal, não há dor que não se cure. O tempo ensinou-me a dar tempo para mim mesmo.

Não me escreva mais. Se quiser, esqueça meu endereço. Nunca existi. Não te nego; nego a mim o meu passado. Aquele mesmo fogo que nos consumiu no começo, acaba por transformar-nos em cinzas no final. Estou desgastado. Debilitado, não de você, mas de mim. Eu tenho a cura e a cólera guardadas juntas. Sou o assunto que mais desconheço e que mais sou íntimo. Não lhe culpo por tua ignorância, só lhe peço a partir daqui uma leve distância.

A mesma que separa-nos do abismo. A mesma que separa a flor do chão. Quero de ti a tênue lembrança de certos momentos; de quando o parque era um lugar bom. Quero de ti a serena lembrança do café pronto na madrugada; eu sou alérgico a cafeína e nunca te disse. Bom que já inventaram os remédios. Quero apenas de ti; a imagem inocente que um cego deve ter do mundo. Dê-me apenas a permissão de te transformar em minhas ideologias, permita-me desenhar-te agora como um príncipe e esquecer que coaxava.

Escrevo-lhe esta nostalgia; para ver se te arrependes dos teus sorrisos sem-hora. De tuas carícias sem-amor, de tuas palavras vazias. Gostaria de pôr algo em ti que fizesse sorrir o mundo. Mas parece que você só se preocupa com a sua boca. Não se preocupe comigo. Você não conseguiria.

Atenciosamente apenas.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Adeus.

Quimeras de que a lua trouxesse.
O som vago de nossos anseios.

Quisera que o mar ecoasse.
O eterno de nossos desejos.

Que estivesse escrito na terra.
Por onde devemos andar.
Que nos dissesse o brilho estelar.
Qual o caminho do céu.

Se jardins eu pudera plantar.
Ou miragens lhe escrever.
De sussurros lhe enlouquecer.
E poder te enamorar.


Mas,
Que me venha o sol da manhã.
Que me venha o canto das ondas.
E a visão do horizonte.
Quem sabe quem estará além-mar.

Que me entorpeça o fulgor das sereias,
Serenamente irei me afogar.

Não mais me interessa o brilho das estrelas,
Muito menos a doçura do teu olhar.

Que me entorpeça a loucura dos bêbados,
Embriagado, irei me levar:

Por toda a solidão que a vida passa.
Por onde a vida passar.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Teus Lírios

I.
Teus lírios são belos,
Teus lírios;
São versos,
Têm o gosto da primeira poesia,
Têm a poesia do primeiro amor,
Têm o amor das poesias;
Desiludidas.

Teus lírios são heresias,
Liberdades, devaneios,
Teus lírios têm o gosto,
Dos pecados juvenis.

Teus lírios são delírios,
Vertiginosos descaminhos,
Teus lírios são vadios,
- De todos, os mais sinceros.

II.

Teus lírios são belos,
De um encanto que mata.
Tens a beleza de quem já morreu.
Ninguém mais toca.

São lírios de ver voar,
De ver passar serenamente,
De arrancá-lo pelo talo,
São lírios só de querer.

Teus lírios morrem sem mais.
Sozinhos e jaz.
Cobrem a terra órfã de suas pétalas.
Por fim, morrerem em paz.

III.

Teus lírios – escondidos -,
Voam com o vento,
Que assopro para ti.

Teus lírios – tão calados –,
Brincam com os pássaros,
Que trouxe para ti.

Teus lírios – desiludidos -
Atrozes, ferozes, mordaz.

Teus lírios são belos,
De uma dor que não cessa,
Jamais.
* A alguém